Lise Meitner e a fissão nuclear: caminhos para uma narrativa feminista.

No início do século XX, as Universidades europeias ainda não estavam abertas à participação de mulheres. Mesmo em meio a um preconceito de gênero explícito, Lise Meitner (1878-1968) almejava entrar nesses espaços e viver uma carreira científica. Meitner era uma jovem austríaca, de família judia, que enfrentou um sistema social e educacional machista, racista e patriarcal. Um sistema que tentou, por elementos formais e não formais, impedir o seu ingresso, permanência e ascensão nas Universidade de Viena e Berlim. Por outro lado, encontrou mecanismos que lhe permitiram acessar espaços, ainda que na condição de ouvinte, como laboratórios, salas de aulas, e se tornar uma das mais importantes Físicas da época. É notório que muitas passagens da trajetória da personagem são marcadas pelo preconceito de gênero e o sexismo presente nas instituições em que predominava a presença de homens. A partir desse contexto, este trabalho tem como objetivo apresentar, discutir e analisar aspectos da trajetória acadêmica de Meitner, numa perspectiva da crítica feminista, usando gênero como uma categoria de análise. Aspectos que são particulares às trajetórias acadêmicas científicas de mulheres no contexto da Alemanha no início do século XX. Para isso, coletamos os dados biográficos a partir de fontes primárias e secundárias, como cartas, artigos de autoria de Lise Meitner e personagens contemporâneos, biografias escritas sobre a personagem, reportagens da época, etc. A análise dos aspectos da trajetória foi realizada tomando por base os referenciais teóricos sobre o conceito de gênero, feminismos e a crítica feminista à ciência, a exemplo de Scott (1995), Rago (1998), Harding (1991; 1996), Schiebinger (2001), Keller (2006), etc. Uma vez feitas as análises parciais, conseguimos reunir alguns aspectos que refletem a condição das mulheres em suas trajetórias acadêmicas científicas. Entre esses resultados estão: a entrada tardia nas universidades, a impossibilidade de acessar espaços de trabalho, proibição de publicação de trabalhos, ausência de cargos, falta de salário, de reconhecimento igualitário. Esses resultados nos permitem compreender o lugar da mulher nesses espaços e o quanto eles são decisivos para que compreendamos o porquê dessas mulheres não alcançarem os mesmos lugares que os seus colegas. São elementos como esses que podem justificar a pouca presença de mulheres em espaços acadêmicos, a pouca adesão de meninas aos cursos de ciências e a perpetuação de práticas sexistas nas salas de aula, nos laboratórios, nas universidades de um modo geral.

 

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